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Guerras são absurdas, mesmo na Cultura Pop

Testemunhamos a guerra, agora. A primeira mais impactante do século XXI. Esperamos que encerre logo. Cambaleamos em passos tortos, em direção à Terceira Guerra Mundial. Que o bom senso volte a reinar antes disso. Mas a estupidez é cega. A estupidez da ganância, do ódio, do egoísmo, da luta pelo poder, da vontade de querer subjugar o próximo, de dominar, de ser o maioral.

O que vemos na guerra em vida, se reflete na cultura. Aristóteles já dizia – “Sem conflito, não há drama”. A guerra sempre tem apelo junto ao público porque representa o conflito em escala máxima. Por isso, a guerra ganhou status de gênero narrativo. Influencia as obras culturais desde o início dos tempos. Volta e meia, marca as histórias da Bíblia. Ganha uma dimensão sombria no livro do Apocalipse, como um triste lembrete do que ainda pode acontecer com a humanidade. A guerra é um dos eixos centrais de O Mahabharata, épico indiano de Krishna Dvapayana Vyasa. É o foco daquela que é considerada uma das primeiras narrativas literárias humanas, A Ilíada, de Homero, que retrata uma guerra de dez anos, entre gregos e troianos. Foi preciso um engodo, um presente em forma de cavalo. O Cavalo de Tróia foi decisivo para encerrar o famoso conflito da antiguidade. Pelo jeito, eles estariam guerreando até hoje, se não fosse aquele presente de grego.

As guerras costumam eclodir pelo mundo, em muitos lugares, entre vários povos, em épocas distintas, ao longo da história. Infelizmente, a guerra caminha com a raça humana. É natural que conquiste seu espaço na expressão artística, nas obras, nas narrativas. O clássico chinês A Arte da Guerra, de Sun Tzu, é estudado até o presente. Seu título já diz tudo. O primeiro romance em francês, A Canção de Rolando, de autoria desconhecida, retrata uma guerra. O romance A Morte do Rei Arthur, de Thomas Malory, também. As maiores obras do bardo inglês William Shakespeare retratam as guerras e suas consequências.

A lista é imensa. Guerra e Paz, de Leon Tolstoi; O Cantar del Cid Campeador, de Per Abbat; Um Conto de Duas Cidades, de Charles Dickens; Os Dez Dias que Abalaram o Mundo, de John Reed; E o Vento Levou, de Margareth Mitchel; Os Sertões, de Euclides da Cunha. Livros de sucesso que resultaram em filmes de sucesso. São narrativas de fantasia ou realistas, inspiradas em guerras reais. Como também existem obras mergulhadas na fantasia ou na ficção científica em que a guerra apresentada, como uma sombra que desperta para o horror de todos. É o caso de Duna, de Frank Herbert, Senhor dos Anéis, de JRR Tolkien, As Crônicas de Gelo e Fogo, de George RR Martin. Nesses casos, apesar de narrar guerras fictícias, são obras contrárias à guerra ou a qualquer tipo de conflito, em abordagem bastante crítica.

Com o nascimento da imagem em movimento, a guerra despertou, logo cedo, nas telas. Havia matéria prima de sobra para alimentar as narrativas. Tivemos a Primeira e a Segunda Guerra Mundial, além de outros conflitos de grandes proporções. Lamentável. O cinema tratou de documentar e registrar. Foram tantos filmes produzidos. Séries e documentários. Que nasceram os subgêneros temáticos, separados por conflito.

O Encouraçado Potenkin (1925), de Serguei Eisenstein, foi seminal, além de ser utilizado como propaganda para justificar o regime russo. Por acaso, a região do conflito retratada no clássico, hoje, localiza-se na Ucrânia. O primeiro a conquistar o Oscar de Melhor Filme foi Asas (1927), de William A. Wellman, sobre a Primeira Grande Guerra. A Alemanha Nazista celebra a guerra com seu filme propaganda, O Triunfo da Vontade (1935), da diretora Leni Riefenstahl.

Apesar de filmes de várias nacionalidades utilizarem a guerra para defender seus valores e mitificar seus heróis, muitos filmes seguem uma linha crítica, contrária aos horrores da guerra. É o caso de filmes como Sem Novidade no Front (1930), de Lewis Milestone; Glória Feita de Sangue (1957), de Stanley Kubrick; Apocalipse Now (1979), de Francis Ford Coppola; Vá e Veja (1985), de Elem Klimov; A Lista de Schindler (1993), de Steven Spielberg; A Vida é Bela (1997), de Roberto Benigni; O Pianista (2003), Roman Polanski; Feras Sem Nação (2015), de Cary Fukunaga. A lista de filmes críticos contra a guerra é imensa.

Para o público geral, é difícil embarcar em obras de guerra cuja realidade tem proximidade com nossas vidas. Por outro lado, aderem com facilidade a filmes como Guerra nas Estrelas – Uma Nova Esperança (1977), de George Lucas, Senhor dos Anéis – A Sociedade do Anel (2001), de Peter Jackson, Avatar (2009), de James Cameron, Duna (2021), de Denis Villeneuve, e suas respectivas sagas, sem perceber que são filmes totalmente contrários a guerra. São igualmente críticos e repudiam as consequências dos conflitos.

São filmes que retratam senhores das sombras como Palpatine (Star Wars) ou Sauron (Senhor dos Anéis) que chegam ao poder sorrateiramente, através de manipulações, conchavos, engodos, covardias e quando assumem tudo, partem para a guerra, movidos pela estupidez da ganância, do ódio, do egoísmo, da luta pelo poder, da vontade de querer subjugar o próximo, de dominar, de ser o maioral. Já vi isso em algum lugar.

Os vilões da ficção refletem muito a realidade, pessoas reais, líderes reais. As consequências são as mesmas. Destruição inútil, ao custo de milhões de vidas inocentes, de miséria, de fome, de sofrimento, de todos os tipos de injustiça. Enquanto, em meio a falta de esperança, surgem heróis que se sacrificam, se arriscam, confrontam e lutam com todas as forças para devolver o equilíbrio ao mundo. A covardia dos grandes vilões é muito curiosa. Eles mandam os outros para guerrear, para lutar, no risco de morrerem, enquanto esses líderes permanecem no conforto, na segurança, no privilégio de suas autoridades, escondidos, longe do perigo. Quando surge o risco de serem capturados, tentam fugir a todo custo, como covardes que realmente são. Se utiliza de qualquer ação questionável, até manter reféns. O resultado da irresponsabilidade da guerra são as milhões de mortes de todos os lados. Mortes inúteis.

Será que essas ficções são tão ficções assim? Mas a grande diferença entre a ficção e a realidade é que nem sempre o bem triunfa ou a justiça é feita ou os heróis sobrevivem ao final. Infelizmente, a história é sempre escrita pelos vencedores e muita sujeira é jogada por baixo dos tapetes luxuosos. Por fim, o que agrada o público é que a ficção sempre recupera o equilíbrio e sentimos um gostinho de vitória, de justiça, de esperança, ainda que a vida nos negue. Ainda que a realidade seja outra. Mas não custa torcer pela vitória. Afinal, a esperança é a última que morre.

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