A nova temporada de O Mandaloriano procura corresponder às expectativas dos fãs e entrega grandes aventuras, combates, batalhas espaciais, mergulha na cultura de mandalore, desenvolve e expande o conflito entre as facções dos guerreiros de armadura e ainda explora um grande arco envolvendo o planeta natal, Mandalore, destruído após o expurgo provocado pelo Império Intergalático, tempos antes. Mesmo assim, a temporada divide opiniões dos fãs e tropeça em algumas escolhas.
Apesar das virtudes da temporada, o início da saga abre com um ponto negativo substancial. Em contraste com a conclusão altamente emocional da temporada anterior, em que vemos a separação dos personagens Din Djarin (Pedro Pascal) e o pequeno Grogu, levado por Luke Skywalker para uma jornada independente, a nova temporada inicia com a dupla principal reunida novamente, sem explicação para quem acompanha apenas a série. Os produtores malandramente optaram por incluir dois episódios inteiros do Mandaloriano dentro da série O Livro de Boba Fett (2022), o que aponta para duas questões. Os produtores sabiam que a série do outro mandaloriano estava fraca e precisavam desse artifício para valorizar a série centrada em Tatooine. Para piorar, esse artifício promove várias tramas importantes para Din Djarin, mesmo fora de sua série, obrigando os fãs a terem que acompanhar a outra produção, se quiserem entender todo esse desenvolvimento. Foi lá que vimos que a Armeira tornou Djarin um renegado de sua raça, além de um confronto empolgante pelo sabre negro e o reencontro emocional com Grogu, com a abrupta interrupção do treinamento Jedi do jovem aprendiz. Foram momentos bem realizados, apesar da péssima escolha dos produtores.
Na série principal, cinco episódios se sobressaem por buscar atender as expectativas dos fãs. O Apóstata, As Minas de Mandalore, O Pirata, Os Espiões e O Retorno. São onde encontramos grandes batalhas, em terra ou no espaço, de grupos guerreiros mandalorianos. Batalhas envolventes, criativas, estratégicas. Grandes deleites visuais. Com destaque para o ataque ao ninho de uma criatura mortal, o combate com os invasores piratas e a batalha final com as emoções elevadas ao máximo.
A exceção foi o conveniente confronto entre Bo-Katan Kryze e Axe Woves, em que o roteiro preguiçoso encontra uma solução com emendos de esparadrapo para resolver o dilema do Sabre Negro, entre os integrantes da facção rebelde.
O aprofundamento da mitologia da raça guerreira, especialmente em As Minas de Mandalore, foi um acerto na trama, com um encadeamento das situações desde a mítica aparição do Mitossauro, o impacto que isso provoca na lider Bo-Katan e na postura da Armeira que assume uma visão mais aberta ao novo, surpreendendo a todos, em contraponto a toda a rigidez da personagem, o que abre caminho para a aceitação daqueles que são diferentes, na tentativa de unificar as diversas facções.
Outro episódio merece destaque por sua construção bem desenvolvida, personagens instigantes e uma reviravolta de impacto, chamado O Convertido. Entretanto, a trama fica tão isolada do restante da temporada que se torna um ponto fraco no todo, quando toda essa trama dos remanescentes do Império deveria ficar distribuída em trechos espalhados ao longo dos vários episódios que teria maior eficiência e equilíbrio dramático integrado às demais tramas apresentadas. O isolamento do episódio é sentido com uma abrupta quebra de ritmo do arco principal. Problema também identificado na série O Livro de Boba Fett.
A saga do Mandaloriano se passa após o filme Star Wars – O Retorno de Jedi e vemos nessa temporada, ainda mais, essa fase de transição em que, aos poucos, a Nova República vai assumindo o poder, tentando organizar as sociedades do universo, enquanto remanescentes do Império continuam nas sombras, na tentativa de retomar o poder. Contexto observado, em maior ou menor grau, ao longo de todos os episódios, mas ganha dimensão maior nos episódios O Convertido, Armas de Aluguel e no explosivo último episódio, O Retorno.
Vale destacar ainda um dos episódios mais controversos, Armas de Aluguel. O tom alegre, de uma sociedade utópica e a presença surpresa de Jack Black e da cantora Lizzo fazem muitos fãs quererem pular para o episódio seguinte. Mas não se enganem. O episódio surpreende por usar da ficção científica para dialogar com nosso tempo presente, ao retratar alguém que tenta se adaptar aos novos tempos, mas ainda vive preso ao passado, numa visão negacionista, em defesa de um regime totalitário, sem se importar com as consequências de suas ações e de como isso pode desestruturar a sociedade utópica em que vive. Daí temos uma brilhante participação do grande Christopher Lloyd, celebrado pelos fãs das franquias De Volta Para o Futuro, Jornada nas Estrelas e Família Adams.
Os fãs ainda questionam o fato do Mandaloriano Din Djarin e seu parceiro, o jovem Grogu, ter virado coadjuvantes de sua própria série, ao valorizar todo o grupo de guerreiros Mandalorianos, nas várias facções. Entretanto, temos a oportunidade de acompanhar o grupo de guerreiros em ação, em vários episódios, desenvolvendo o potencial de cada um deles. Seus momentos em combate e a maneira como a cultura mandaloriana influencia suas ações. Algumas batalhas tornam-se memoráveis, por mais que caiam em algumas conveniências e clichês, até mesmo da própria saga espacial, com direito a robozinho sabotando computadores do império para facilitar a invasão dos heróis.
O último episódio, O Retorno, equilibra a batalha em diversas frentes, com muita emoção, tensão, cenas empolgantes, grandes estratégias e sacrifícios. Destaque para a sequência com o cruzador e o duelo final contra Moff Gideon (Giancarlo Esposito). Mas a trama do sabre negro não deveria ter o desfecho apresentado, numa escolha desperdiçada, sem um desdobramento coerente. Pelo menos, a sequência posterior eleva o tom emocional na escolha de Din Djarin sobre Grogu, diante dos demais mandalorianos, às margens das águas sagradas das minas de Mandalore. Como deve ser. Temos aquela sensação do cisco que insiste em cair no olho, nas horas indevidas.
Como epílogo, todas as tramas se fecham de forma que, se essa fosse a última temporada, seria um final aceitável. Um resgate da estrutura básica do início de toda a saga, com Din Djarin vivendo apenas com seu afilhado Grogu, isolado, nas fronteiras do vilarejo que ajudou a salvar, em um planeta periférico. E até retoma sua rotina, em busca de trabalho como mercenário. Resgatando para o personagem, o seu cenário base, o Faroeste intergaláctico. Mesmo assim, essa saga de Star Wars ainda deve se manter por mais tempo, conquistando seu espaço como um dos maiores sucessos da franquia. A Disney Plus agradece.
Entre mortos, feridos e sobreviventes, nota:
Nalvany (2022) – Documentário | Crítica